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A ADORAÇÃO PELO CINEMA

Atualizado: 10 de fev. de 2021

Não importa o gênero. É praticamente impossível encontrar alguém que não goste de assistir a um filme. A sétima arte é acessível a todos os gostos e níveis de conhecimento, das produções sofisticadas, que envolvem tramas conceituais, até às narrativas de fácil compreensão. Acontece que o cinema tem uma mágica própria. No momento em que inventaram a sala escura, a projeção em uma tela gigante, com qualidade de som e o fato de estarmos em um espaço com várias pessoas que não conhecemos, onde não é permitido criar ruídos, é quase como se estivéssemos em um lugar sagrado. Como não há interrupção (tão comum em tempos de plataformas streaming), mergulhamos no universo cinematográfico onde tudo conspira para uma experiência significativa. Afinal de contas, quantos filmes você já assistiu e teve vontade de não levantar da poltrona, de continuar viajando numa história?


Fotos: Maiki Castilhos
Fotos: Maiki Castilhos

O impacto das narrativas, às vezes, é tão grande, e até mesmo transformador, que saímos profundamente envolvidos por uma obra. Sentimos tristeza, felicidade, dor, leveza, aversão, empatia. “Tenho certeza que um dos papéis da arte é tocar em temas difíceis, que são tabus ou as pessoas têm receio de falar. Quando você expõe assuntos complicados através de uma manifestação artística você está prestando um serviço à sociedade. Lógico que o cinema é entretenimento, e essa talvez seja a função primordial dele, o que não é nenhum demérito, mas acredito em sua função social. Grandes diretores têm essa preocupação e sentem necessidade de contar histórias lindas inseridas em contextos trágicos da humanidade. ‘A Lista de Schindler’ é um ótimo exemplo disso. Uma obra cinematográfica”, avalia, com conhecimento de causa, o produtor, diretor e roteirista caxiense Le Daros.


O foco dele está nas áreas da produção audiovisual onde a criatividade é fundamental, como roteiro (essência de um filme), direção e trilha sonora. Sua trajetória no cinema começou há 12 anos. Por ser músico, ele criou a trilha sonora e escreveu seu primeiro roteiro para o curta-metragem “Ilha das Janelas Fechadas”, de 2009, viabilizado pela Lei Municipal de Incentivo à Cultura (LIC). “Na época estava lançando meu segundo CD, só que como gosto de fazer muitas coisas escrevi o argumento e mostrei para um casal de amigos. Eles adoraram. Fiquei animado e levei a ideia para uma produtora de vídeo”, conta.


Fotos: Maiki Castilhos
Fotos: Maiki Castilhos

Le acompanhou todas as etapas de produção do curta, incluindo as gravações. “Enlouqueci com tudo aquilo, fiquei apaixonado pelo processo e percebi que queria muito fazer cinema. Foi algo bem intuitivo. Logo depois fiz meu primeiro curso voltado ao cinema, sobre escrita de roteiro com um britânico que morava no Brasil. Também fui a São Paulo fazer um curso na Academia Nacional de Cinema”. Da capital paulista, ele voltou “pilhado”, com a vontade de trabalhar em mais um curta, mas como diretor. “Rua dos Aflitos 70” foi lançado em 2011 e exibido, inclusive, no Festival de Cinema de Gramado. Para Daros, o cinema é um canal de manifestação artística extraordinário, com infinitas possibilidades, envolvendo a escrita de uma história, o cenário onde ela vai se passar, a interpretação dos atores, a música que interfere no andamento da trama, a fotografia dos lugares. “É uma arte que permite construções narrativas fora da cronologia natural, a criação e a vivência de novos universos, o fantástico de cruzar as fronteiras entre o real e o irreal”, complementa.


Nos últimos anos, o mercado de vídeos se tornou gigantesco. Há um exército enorme de amadores, além dos profissionais. Mas produzir filmes é outro departamento. Requer, necessariamente, uma boa estrutura de capital financeiro, humano e tecnológico. E há mais gente buscando recursos do que o mercado dispõe. Câmeras, locações, figurinos, cenários, elenco, tudo importa e tudo impacta em quem está assistindo. “E se você não tiver um bom roteiro, uma boa estrutura, uma boa equipe, você não faz cinema. Se faz, fica ruim. E se fica ruim, não tem espaço para divulgar”, diz Le. Seu currículo acumula seis filmes, dois documentários e uma websérie de ação e suspense onde já foram produzidos dois episódios de um total de seis previstos. Embora o diretor consiga produzir com leis de incentivo locais, seu objetivo é se inserir no mercado dos longas, onde é possível ter uma remuneração para se dedicar apenas ao cinema. “Estou no terceiro tratamento de um roteiro para um longa metragem”, adianta.


O entusiasmo pela sétima arte


Um sentimento intenso que possui capacidade de alterar o comportamento. Excesso de entusiasmo. Adoração por algo específico. São definições encontradas no dicionário da Língua Portuguesa Houaiss sobre paixão. São conceitos básicos, mas capazes de explicar, em parte, o que o cineasta colombiano Daniel Vargas, 42 anos, sente pelo cinema. Dedicado à sétima arte, Vargas também é professor de cinema e fotografia no Centro Universitário da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) e coordenador do Ponto de Cultura Núcleo Audiovisual (NAV). No cotidiano desses locais de trabalho, assim como em sua produtora, a Xamã, Vargas entrega-se à paixão pelo cinema.


A adoração, em determinada época de sua vida, o levou a acreditar ser o cinema algo intocável. “O meu respeito por essa linguagem é tão grande que via como algo imaculado e distante, a ponto de desacreditar que poderia trabalhar com cinema”. Apesar de estar em contato com o universo da imagem por meio dos equipamentos fotográficos do pai, Vargas demorou para entender qual era o seu caminho. “Ainda quando era menino observava meu pai fotografar. Lembro de imagens que me deixavam impressionado. Ele já mexia com câmeras de fotografia e de vídeo naquela época. Foi um processo de encantamento e respeito”, conta. Porém, em 27 de novembro de 1989, uma bomba derrubou um Boeing 727 da Avianca que sobrevoava o município colombiano de Soacha, matando todos os 107 ocupantes, dentre eles o pai de Daniel. O explosivo estava na maleta de um jovem que, recrutado pelo Cartel de Medellín, embarcou achando que carregava um gravador. O objetivo de Pablo Escobar, então chefe do cartel, era matar o candidato a presidente da República, César Gaviria, que não estava no voo.


Fotos: Maiki Castilhos
Fotos: Maiki Castilhos

A tragédia levou o cineasta a outros caminhos. Ele cursou Administração e, em seguida, transferiu para Publicidade e Marketing. Mas o seu destino mudou ao ter o talento reconhecido por um professor. “Me encontrei na vida, cheguei no que eu sempre deveria ter feito, porque antes estava perdido devido à morte do meu pai”, ressalta. Assim, formou-se pela Universidad Politecnica Grancolombiana e não parou mais de produzir e estudar. É mestre em Letras, Cultura e Regionalidade pela Universidade de Caxias do Sul (UCS) e possui especialização em Roteiro para Documentário pela Universidad del Valle, de Cali, na Colômbia. Entre os primeiros trabalhos feitos no Brasil tem um carinho especial pelo documentário “Profissão Músico”, o qual foi diretor.


Uma das maiores loucuras cometidas em nome da paixão pelo cinema, segundo Vargas, está na própria escolha da sétima arte como profissão. “Quando comecei a estudar cinema, entreguei minha vida à arte cinematográfica. Foi um casamento, uma paixão que se instalou com muita força”, destaca. Para ele, o cinema é uma narrativa completa, pois uma imagem, carregada de movimento, fotografia e som, pode contar muitas coisas. Para ele, nenhuma outra linguagem pode juntar tantas formas de comunicar, motivo pelo qual ele a escolheu para contar a história do seu pai em um documentário que está na fase de produção. “Tenho vários sentimentos que só a partir de uma construção cinematográfica vou conseguir contar”, revela.


O sentimento de amor e gratidão que Vargas tem pelo cinema é repassado através do exercício da profissão de professor. “Sinto que tive a oportunidade de estudar e vejo como responsabilidade minha passar esse conhecimento às pessoas”. Essa missão em despertar nas pessoas o interesse e o conhecimento sobre o cinema tem tido êxito. Foi na sala de aula do NAV - onde várias oficinas gratuitas são oferecidas durante o ano - que Lauren Fogaça, acadêmica de Publicidade e Propaganda, decidiu aprender a produzir filmes. Com apenas 20 anos, já conquistou dois prêmios no Festival do Audiovisual da Serra Gaúcha (Cineserra): 3º lugar com o videoclipe de “Vick Lindembergh” e Menção Honrosa com “Escarlate”. Esse último a levou a conquistar o atual emprego na Spaghetti Filmes, de Caxias do Sul. O trabalho, na época que foi lançado, encantou os jurados da mostra de trabalhos universitários Desafio FSG. Entre eles, estava o proprietário da produtora, Lissandro Stalivieri, que identificou o potencial e logo convidou a jovem para trabalhar com ele. Conforme Lauren, largar o emprego fixo que tinha na Receita Federal e partir para o universo da imagem foi um grande desafio. “Tive de vencer meus medos internos. Você sair de um lugar certo para entrar em uma produtora grande, sem nenhum background de trabalho, é cavar espaço”, afirma.


Antes de entrar para a produtora, Lauren chegou ao NAV, com apenas 16 anos. A intenção era participar do Grupo de Estudos em Documentário, ministrado por Daniel Vargas. “Fui para o curso teórico, mas surgiu a oportunidade de gravar um documentário”. Naquele momento, a jovem pegou pela primeira vez uma câmera para gravar. O resultado está no documentário sobre o primeiro espetáculo do Coro Juvenil do Moinho/UCS “Tanto Mar a Navegar”. “É o meu trabalho mais caseiro, mas o que tenho mais carinho”, diz, emocionada.


Fotos: Maiki Castilhos
Fotos: Maiki Castilhos

O documentário é o carro-chefe das produções de Lauren. O gênero cinematográfico exige conhecer pessoas e suas histórias. É assim que a jovem, tímida, se revela por de trás das câmeras. “É a forma que me comunico, que faço acontecer e lido com as pessoas”. Apaixonada pelo que faz, Lauren espera evoluir profissionalmente e como pessoa, ao manter contato com diversas realidades. “Não consigo viver no comodismo, quero sair, conhecer pessoas, contar histórias, fazer justiça do jeito que dá e trabalhar por um mundo melhor”.

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